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Quem sai aos seus

Um blogue para a Madalena, para a Teresa e para a Francisca.

Também já li

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Li, finalmente, "Alentejo Prometido". Peguei nele na quinta-feira de manhã, dia 17 (onde isto já vai...), e só o larguei na manhã do dia seguinte (da semana passada). Não houve Netflix, Facebook ou qualquer distração capaz de me fazer tirar os olhos do livro do momento. Pelo contrário, contei com a preciosa ajuda de uma viagem de uma hora desde a Faculdade de Letras e uma boa insónia da Quica às 05.00. Está muito bem escrito. Dá gosto. E só tenho pena de não ter escrito o que se segue quando estava no auge da epifania.

Para já, mesmo que não tivesse essa escrita agradável, que tem, aplaudiria este livro porque é muito difícil este exercício ao estilo "Bilhete de Identidade" em que o autor relata a História e se confronta com os seus próprios fantasmas. Como leitora, agradeço a existência de escritores como Maria Filomena Mónica e Henrique Raposo.

O que mais gostei foi ler como uma pessoa desenraizada se sente. Para mim foi uma visão nova e refrescante, pese embora me tenha ficado a dúvida: será que o autor não tem mesmo um local de pertença? Depois, adorei quase todos temas que os alentejanos viram como atentados à sua honra. A ver se me explico: o que o autor atribui como características do Alentejo que conhece são características que vi enquanto crescia na parte rural do concelho de Sintra. E, portanto, o veneno de uns foi a redenção de outros. Gostei de perceber que não estava sozinha! Em resumo, e tudo somado, penso que se trata mesmo de um retrato de um Portugal rural. Bate certo com o título da coleção -- Retratos da Fundação [Francisco Manuel dos Santos]. E fica tão, mas tão claro o abismo que existia entre as pessoas que viviam em Lisboa e o resto do país que não consigo evitar o meu momento de levantar o braço e gritar 25 de abril sempre, fascismo nunca mais.

Ao princípio, houve estranheza. Homens que ficam à porta durante a missa de casamento é coisa do Alentejo? Parece-me que não. Não é lei, mas acontece muito no mundo que conheço. Nem é ficar à porta, é ir diretamente para o Faneca (lado Sintra) ou para o Fradinho ou Pólo Norte (lado Mafra). Acontece nos casamentos e nos funerais. Nunca entendi esta atitude como sinónimo de falta de fé, mas como um ato de afirmação masculina. Uma mulher com escasso temor a Deus teria de aguentar a cerimónia na mesma...

É no capítulo II, quando Henrique Raposo e os acompanhantes entram num café à procura de respostas e são olhados com desconfiança que a minha empatia acontece. Ao autor impressiona-o a estranheza com que é olhado, a mim surpreende-me que haja locais deste país onde isto não acontece.

Quando tinha uns 20 anos e pouca experiência a conduzir fui aos correios de S. João fazer um recado. No regresso, encostei demasiado à berma e furei não um, mas os dois pneus do lado direito. Era uma época sem telemóveis, portanto dirigi-me à loja mais próxima e pedi para fazer um telefonema. Fui olhada com a máxima desconfiança! As pessoas ficaram a fazer de conta que estavam na sua vida enquanto ouviam a minha conversa com o meu pai (quase a chorar) e só baixaram a guarda quando ouviram o que se passava. Como vítima da desconfiança, achei ultrajante, mas estou do lado das pessoas que ficam a ouvir a conversa até se certificarem que não vão ser roubadas. Um vendedor de enciclopédias pode ser um vigarista. Cansei-me de ver e ouvir histórias dessas em pequena (nr: é por isso que desconfio sempre dos bem-falantes). Portanto, sim, se um estranho chega ao café, claro que o observo atentamente. E hoje até me acontece outra coisa. Entro no café e pessoas que me são estranhas desconfiam de mim ao mesmo tempo que desconfio delas. A minha terra também já não é assim tão fechada. Como diz a minha avó, "está para aí gente de fora que nunca mais acaba". 

O Alentejo litoral é descrito como uma zona recente, violenta. É das descrições mais interessantes, e mais uma vez porque, embora o contexto histórico do nascimento da zona litoral do Alentejo seja muito diferente do que acontece para os meus lados, a violência era um dado adquirido até há relativamente pouco tempo. Não que tenha presenciado tais coisas, mas, sem ir mais longe, o meu bisavô esteve preso por ter matado um homem. Isto não é coisa que se apresente num currículo e não o digo com orgulho, mas é um facto. Telefonei ao meu pai a confirmar essa história e a minha tese de que a violência era muito mais aceite e por isso mais comum. Ou mais comum e por isso mais aceite. Segundo o meu pai, "toda a gente ia para os bailes com uma sachola". As rixas entre pessoas de terras rivais era comuns. E o vinho. O caso do meu bisavô aconteceu quando ele era solteiro e a pena de prisão foi, imagine-se, de uns 18 meses. Quando saiu, voltou à sua vida e a única coisa que podia denunciar algum problema foi o ter casado abaixo das possibilidades. Os pais tinham algumas terras, a mulher era criada de servir. E daquelas que não reza a história (parece que até nisto havia ranking). O caso é que deu a volta por cima. Teve duas filhas espertas (e mais um rapaz). A minha avó podia ter sido "mestra" e até esteve para tirar a carta de condução, o que de certeza teria sido impressionante nos anos 40. Depois, é o que se conta na minha família, um irmão morreu num desastre e como "parecia mal" ela tirar a carta depois de uma tragédia que envolvia carros nunca mais se falou no assunto. Hoje está velhinha mas ainda escreve muito bem. Faz dedicatórias nos envelopes com dinheiro que oferece aos bisnetos. Tem, pelas minhas contas, 18. É possível que, ao contrário dela, eu esteja a fazer mal as contas.

Sobre as famílias, parece-me que era fácil encontrar o modelo "meus-teus-nossos" (embora não tivesse um nome tão cool). Só na minha família materna há a história de um homem com uma filha que se casa com uma mulher com dois filhos e têm mais três. Na família do meu pai também há o homem com uma filha que se junta com uma mulher que também tem uma filha. As miúdas foram criadas juntas. Mas, neste caso, admito que a falta de dados é um grande problema.

Finalmente, a parte que mereceu amplo debate (e muita risota, vá!) num jantar de sushi com duas amigas desta época: "Os pais não precisavam de telemóveis para saber onde estavam as filhas, tinham os olhos de toda a comunidade e a rede dos mexericos. As raparigas não podiam ser vistas com um rapaz, gerava logo falatório, marcar um encontro com o namorado era uma odisseia camiliana que implicava recados passado por amigas de confiança e uma estratégia para ultrapassar a vigilância de pais, irmãos e vizinhos". Haveria muita coisa a dizer sobre este assunto, mas, como dizia o outro, os envolvidos estão vivos, vamos respeitá-los. Quero apenas dizer que com 16 anos saía todos os fins de semana, o que me parece impensável que as minhas filhas venham a fazer. Saía, mas saía com vigilância, porque, creio, era entendido culturalmente que as pessoas podiam começar a "procurar" par com essa idade. Bem, no caso das raparigas, era mais "porem-se a jeito para ser encontradas"  por um pretendente estivesse à altura. Como em qualquer parte, era preciso beijar muitos sapos até encontrar um príncipe. A questão é que aqui nem beijos podia haver! Até ler este livro achei que isto era uma especificidade da minha terra. Pelos vistos, não. Estou aliviada. Sempre achei anacrónico ter de sair acompanhada. Percebia, sem conseguir dizer, que atentava contra as minhas liberdades de cometer os erros que bem entendesse. Felizmente para os meus pais, e para mim, nunca fui muito gira.

Voltei à Meia Maratona e ganhei 23 minutos

O grande-grande destaque da Meia Maratona 2016 vai para a Inês, que completou a sua primeira corrida de 21,1 quilómetros.

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Mas queria deixar registado que fiz a segunda corrida da Ponte 25 de Abril, no domingo passado. Em 02:16, menos 23 minutos do que há um ano, mas com uma dor no pé bem chatinha. Estou a evitar ir ao ortopedista com medo da resposta (true story) mas, segundo o Dr. Google, a variedade de moléstias à disposição do corredor é apreciável. A que vai melhor com os meus padecimentos é esta: metatarsalgia. Sempre uma fã destes nomes!

 

[PS: Este blogue anda com um sentido de atualidade arrepiante. Mas não desistam agora. Lá para os Santos chego ao terrorismo.]

 

 

Mãe, diz-me a verdade...

Esperava um cenário mais pomposo mas foi mesmo na garagem, enquanto as irmãs disputavam lugar à janela dentro do Mentinha (o nosso carrinho). A Madalena chama-me ao lado e pergunta:

- Diz-me a verdade (risos)... A fada dos dentes és tu?

- (risos) Sim.

Houve ali cinco segundos de desilusão esmagados pelo facto de ter percebido uma coisa super importante. E mais risos...

- Por isso é que um dia ela não veio (mais risos).

- Pois, eu não tive tempo. Pausa.

E volta à carga:

- Isso quer dizer que a fada das chuchas também és tu?

- Sim.

- Ahhhhh...

- Como é que descobriste?

- A M. tinha um dente debaixo da almofada e no dia seguinte a mãe disse-lhe que ninguém lhe tinha dito.

Pausa. Agora falo eu.

- É um segredo só nosso, não podes dizer nada às manas. Queres ser a fada dos dentes das manas? Mais risos.

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